Carta de repúdio as remoções e desalojos


“No dia 13/12, um grupo de familias ocupou um prédio na rua Mém de Sá 234, no Rio de Janeiro. O imóvel na Av Men de Sá, 234, nem sequer estava sob propriedade do INSS, somente possui uma precatória da venda do antigo proprietário para tal órgão público e está abandonado por mais de 20 anos. Um grupo de pessoas se direcionou ao local para apoiar esse ato. A PM junto com a Polícia Federal promoveu um despejo sem mandato judicial, prendeu 7 dos manifestantes pacíficos em apoio à ocupação (Estudantes e Professores) e além de tê-los agredido fisicamente agrediu também os defensores públicos, vereadores, estudantes e professores presentes. Demonstrando assim o efetivo Estado de Exceção que vivemos. Nossos direitos naquele momento foram suspensos e simplesmente fomos alvos da violência de policiais que agiam em nome da lei fora da própria lei.
Uma manifestação pacífica se transformou em uma demonstração de violência da polícia.
Fui um dos detidos, enquanto estava sendo arrastado para o camburão levei cassetadas e ao olhar no rosto de um dos policiais o vi mirando em minhas costelas e em meu saco. Será que esse é o procedimento padrão para uma detenção?
Enquanto estava no camburão, inicialmente com mais sete pessoas, inclusive duas mulheres e um companheiro que sofre de claustrofobia, meu corpo ardia com a mistura de spray de pimenta e o calor de quase 40 graus do rio de janeiro. A polícia parecia brincar ao abrir e fechar a única entrada de ar efetiva do carro.
Já na delegacia, dois dos companheiros presos tiveram que ficar pelados sem uma justificativa clara. Ficamos de 13:30 até as 19:00 sem podermos dar nosso telefonema. Além de nos deixarem ir no banheiro apenas uma vez. A última pessoa entre as detidas foi liberada apenas às quatro da manhã.”

Prezados (as) leitores (as),

no decorrer dos preparativos para os Jogos Olímpicos e a Copa do Mundo observa-se uma política descompromissada com a população e seus respectivos direitos fundamentais.

Em entrevista recente, Raquel Rolnik, relatora da ONU para a moradia adequada, denuncia a ocorrência de remoções de moradias sem qualquer aviso prévio. Em alguns casos, as remoções ocorreram na ausência dos próprios moradores, que, evidentemente, “ficaram atônitos ao chegar, após o trabalho, ao lugar onde antes se situavam suas casas e não encontrá-las mais” (Rolnik).

A prática de remoção adotada pela Prefeitura (Eduardo Paes) e Secretária de Habitação (Jorge Bittar) compara-se a práticas fascistas: submetem parcelas vulneráveis da população a prejuízos materiais e imensuráveis danos imaterias. Pessoas são retiradas das áreas onde construíram suas vidas, onde constituíram suas comunidades, logo, onde estão suas relações sociais, afetivas e de trabalho. Essa expulsão tem ocorrido sem indenização ou mediante uma indenização irrisória.  Tais populações são, posteriormente, realocadas para casas a mais de 60km de distância. Particularmente em áreas com serviço públicos escassos. Além desse fato, as novas residências fazem parte do programa Minha Casa Minha Vida, logo essas pessoas além de terem todos os prejuízos materiais e imateriais da saída de sua residência, ainda adquirem, impositivamente, uma nova dívida, já que é necessário o pagamento de mensalidade pela casa desse programa.

Além de tais remoções esses poderes estão atuando no desmonte de um dos mais legítimos movimentos sociais do Rio de Janeiro: o movimento de ocupações urbanas. Pouco a pouco as ocupações no centro do Rio que se organizam horizontalmente, possuem práticas de auto-gestão e possuem projetos culturais e políticos para seus moradores e moradoras, assim como para a comunidade em seu entorno, recebem cartas de desalojo. Prédios que ficaram abandonados por mais de 20 anos e que após uma ação popular de ocupação passaram a abrigar projetos políticos populares, estão sendo retomados e transformados em projetos destinados ao capital e a iniciativa privada.

Em nome do direito à moradia digna e em nome da democratização do espaço urbano, o Núcleo de Inclusão Social (www.projetonis.com), o Instituto de Medicina Social (http://www.ims.uerj.br) e o espaço auto-gerido CASA (http://casa-rio.blogspot.com)  manifestam seu  repúdio a tais ações da prefeitura e da secretaria de habitação e solicitam que se constitua um observatório popular sobre essas atividades, capaz de acatar denúncias e submetê-las a uma avaliação por parte dos órgãos competentes.

Rio de Janeiro, 04 de julho de 2011